Capítulo 8


8.
... desfaleceu na minha frente deixando somente uma nuvem de dúvidas e incertezas sobre o pouco que me restava de sanidade.
As pernas passavam uma pela outra riscando o ar num vulto unicolor. Os pés ágeis mal tocavam o chão e já saíam em busca de mais um salto. Respiração ofegante. O consumo  excessivo de oxigênio fez os músculos se movimentarem compulsivamente. Cortei a resistência do ar lançando-me contra o vento que irritava os olhos. Lacrimejavam na mesma intensidade em que ardiam. Na cabeça, uma  só  ideia permanecia intacta no farrapo pessoal que me encontrava: precisava chegar em casa, iniciar uma nova vida sem caderno negro e,  na falta das velhas, criar novas memórias.
Ofegante, fechei a porta de casa. Tinha abandonado aquele homem num ato egoísta de autopreservação. Não seria bom esperar a polícia me encontrar novamente em uma cena daquelas. Faltaram-me argumentos nas minhas tentativas de defesa anteriores. O medo da falta de palavras me expeliu daquele lugar. Eu precisava buscar refúgio nos limites das paredes que me abrigavam.
Com corpo e mente agitados, caminhava pelos corredores sem conseguir parar. Refletia as últimas palavras daquele sujeito sem compreendê-las. Encontrava-me perdido no labirinto de pensamentos que se formou por detrás das pálpebras abertas. Sentei no sofá, cerrei os olhos e tentei me acalmar um pouco. Não conseguiria ter decisões coerentes com o físico e espírito trabalhando naquela velocidade.
Após algum tempo deitado no sofá, tomei o caderno em minhas mãos. Questionei-me se era aquele o livro que o suicida tinha mencionado. Não compreendi por que ele chamou o caderno de livro até chegar na última página preta. Como aquilo aconteceu? De onde surgiram aquelas palavras? Uma folha negra a mais. Nela, um nome e um endereço escrito. Surpreso, soltei o objeto que caiu com as páginas viradas para baixo. O nome e o endereço escrito nelas, que congelou as minhas entranhas, me fez compreender um pouco do mistério estampado naquelas linhas.


Imagem: Márcio